Dan Rice foi um palhaço americano que no século XIX usou sua popularidade para promover candidatos políticos.
Em suas campanhas, usava carroças circenses que traziam a frase “pule em nossa carruagem!” — ou, em inglês, “jump on the bandwagon”.
Era um sucesso: as pessoas seguiam as carruagens e pulavam para dentro delas.
Foi emprestado daí o nome do “efeito bandwagon”, conhecido também como “efeito arrasto” — ou, ainda, como “efeito manada”.
Trata-se de um viés comportamental humano bastante comum, amplamente estudado pela psicologia, e mais tarde apropriado pela economia: a tendência de conformidade que os indivíduos têm para se alinhar com a maioria, ou de aceitar a influência de seus pares.
Essa tendência de conformidade pode ocorrer mesmo nas situações em que seguir a maioria signifique ir contra opiniões pessoais.
Assim, mesmo não gostando de determinado produto, a pessoa pode passar a comprá-lo, apenas porque esse é o produto consumido por grande parte de um círculo social predominante.
A publicidade, por exemplo, deita e rola nesse efeito desde que o mundo é mundo.
Camel dizia que era o cigarro mais fumado entre os médicos.
Colgate diz que é o creme dental mais recomendado pelos dentistas.
E por aí vai.
“Eu não me influencio pelos outros!”
“Eu não me influencio por propaganda!”
“Eu sigo minha opinião!”
Aham.
Tá certo.
Façamos o seguinte: aceitemos que somos assim.
Não é nossa culpa.
É adaptativo.
Nosso cérebro é “desenhado” para agir de forma, digamos, eficiente, ou seja, busca atalhos, procura a forma mais fácil de resolver um problema – o chamado satisficing.
(Neste momento, o Altay e o Billy, dois amigos neurocientistas, podem estar mentalmente me assassinando pelas simplificações, mas paciência.)
É melhor aceitarmos os fatos para então passarmos a evitar as armadilhas que colocam em nossos caminhos.
*
Mas as consequências do “efeito bandwagon” não ficam apenas no campo do consumo.
Elas chegam em decisões, digamos, mais sérias.
É aqui que voltamos ao palhaço Dan Rice.
Afinal, não é à toa que ele era usado em campanhas eleitorais.
Associar uma candidatura a um movimento que representa que “todos estão nesta carruagem”, é uma forma simbólica de ativar o próprio comportamento de manada que ele viria a apelidar.
“Nós” (quem está dentro do vagão) contra “eles” (quem está fora).
Brilhante.
Maquiavélico, mas brilhante.
Hoje, temos mais um elemento importante: as pesquisas eleitorais.
Feitas principalmente por telefone (antigamente eram entrevistas presenciais), elas tentam detectar em quem as pessoas votarão no dia das urnas — mas o que conseguem é, no máximo, identificar em quem elas votariam se as eleições fossem naquele momento da pergunta.
São duas coisas bem diferentes.
Mas minha análise aqui é outra: é sobre o efeito dos resultados das ondas dessas pesquisas nas pessoas — às luz do “efeito bandwagon”.
O eleitor, ao acompanhar as pesquisas eleitorais, inevitavelmente se deixa influenciar pelo resultado em si — assim como ocorria com cigarros ou ocorre com cremes dentais.
Ao ver que o seu candidato preferido possui poucas chances de se eleger, o eleitor pode acabar escolhendo outro candidato, que apresente maiores chances de vitória.
Essa escolha pode ocorrer por puro pragmatismo, para evitar uma sensação de inutilidade do voto.
É o que se convencionou chamar de “voto útil”.
Às vezes isso acontece por proximidade ideológica — “ah, esse creme dental é parecido com aquele outro”.
Mas, às vezes, a rejeição pela segunda opção é tão grande, que se opta por algo ideologicamente contrário a seus valores pessoais.
E o eleitor, então, pós-racionaliza sua escolha, para ter um conforto emocional sobre sua decisão — a este fenômeno a psicologia dá o nome de dissonância cognitiva, mas não vou me estender aqui sobre isso.
*
Acontece que as pesquisas, várias vezes, têm precisão, mas não levam em conta os conhecimentos e as inseguranças prévios das pessoas — consideram-as tábulas rasas.
O que isso quer dizer?
Que as pesquisas eleitorais refletem somente uma realidade instantânea, independente do passado e incertas em relação ao futuro — é como o jogar de uma moeda que não influencia na próxima jogada.
Porque as amostras são enviesadas.
Porque o campo por telefone é menos acurado que o campo presencial.
Porque a amostra de respondentes é diferente da amostra que vai de fato votar no dia das eleições, quando há uma taxa de abstenção significativa.
Porque existe o viés de resposta, quando o respondente diz o que acha que o entrevistador quer ouvir — ou quer parecer que pensa algo.
Porque existe a espiral de silêncio, que faz com que algumas pessoas evitem manifestar suas verdadeiras opiniões, por medo de rejeição.
(Mais sobre o assunto neste vídeo do Átila no canal Nerdologia e neste episódio do podcast Naruhodo.)
*
Entretanto, como dissemos, o “efeito bandwagon” é alimentado pelos resultados das pesquisas.
Isso ocorre independentemente de todos esses viéses e poréns das pesquisas.
A imprensa não conhece isso tudo, nem tem tempo para explicar tudo isso. — e essa lógica da urgência acaba distorcendo a verdade.
E, sejamos francos, a maioria das pessoas está pouco se lixando.
Resumindo: o comportamento de manada está se baseando em números sem acurácia.
São os mesmos números que disseram, por exemplo, que a Inglaterra permaneceria na UE, que a Colômbia aceitaria um acordo de paz com as Farc e que Trump não seria eleito.
Assim, o comportamento de manada pode estar fazendo com que a sua própria profecia se realize.
*
Eu não estou aqui pra dizer o que você deve fazer com tudo isso.
Meu objetivo era só compartilhar algum conhecimento.
Somos adultos (e, espero, vacinados) e cada um deve fazer suas escolhas.
Dito isso, minha mensagem final é mesma do Laerte:
– Calma, gente.
Eu adorei o seu texto Ken e acho que vc deveria compartilhar em todas as suas redes sociais. Compartilha lá que eu compartilho também . Pois é exatamente com esta sensação que a maioria das pessoas está neste momento. Com medo de um resultado x, deixam de votar em seu candidato . Eu vou no meu que acredito, apesar de todos me dizerem que eu devo votar no #elenao pra não colocar de volta no poder o #eletambemnao (ou será o contrário ). A consciência vai ficar limpar. Obrigada por compartilhar.
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Fabíola, que bom que você curtiu. Já tá compartilhado no Facebook, e já tem links apontados pra cá nas outras redes. 😊
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É a chapa Bolsolula!
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